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Decisão do STF sobre descontos previdenciários sobre férias e adicionais e seus mínimos impactos

Por Francis Bordas,

Não canso de me impressionar sobre a baixa qualidade da imprensa brasileira. Esta semana tivemos novo exemplo e, dessa vez, não é sobre eleições. Foi noticiado o encerramento, no Supremo Tribunal Federal (STF), de um processo que já não tinha nenhum resultado prático. Era sobre o julgamento do processo em que se discutia a incidência dos descontos previdenciários sobre parcelas que não são incorporadas aos proventos de aposentadoria, tais como férias, adicional de insalubridade, etc.

Facilitando para o leigo, tratava-se de decidir o seguinte: por que o servidor deve recolher previdência sobre algo que não se transformará em benefício no futuro? Guardadas as proporções seria o mesmo que dizer que as contribuições ao INSS incidem sobre todo o salário (mesmo que superior ao teto) mas o benefício fica limitado a um limite máximo (teto).

Visto assim, parece simples. E de fato, de tão simples que é, o próprio Governo Federal não faz esta cobrança desde 2012, depois de sucessivas derrotas judiciais, inclusive dentro do próprio STF. Mas o que a imprensa tem a ver com isso?

A revista Veja, por exemplo[1], estampa esta notícia com uma foto de uma agência do INSS, e relata assim: “Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) causará uma perda de 6,3 bilhões de reais ao caixa do governo e que impactará, sobremaneira, a Previdência Social”. E prossegue a notícia destacando o “prejuízo”: “A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), órgão responsável por gerenciar a dívida ativa da União, afirma que isso fará com que o governo desembolse 6,3 bilhões de reais para arcar com essa mudança”. A revista Istoé segue a mesma toada[2], porém, sem a “bola fora” de vincular a notícia ao INSS, que não tem nada a ver com o assunto.

Por que sempre que um direito social é afirmado pelo Judiciário, a imprensa só fala em prejuízo? Por que tudo é dinheiro e sempre sob a ótica do custo? Estivéssemos noticiando uma decisão que declara inconstitucional uma determinada arrecadação tributária de uma indústria, o enfoque seria o mesmo? Ou a imprensa estaria, ao contrário, denunciando uma barbaridade cometida pelo Governo?

Arrecadação tributária não se limita a impostos. As contribuições para a seguridade social são também tributos e quando o STF declara sua inconstitucionalidade está dizendo que o Estado errou e cobrou a maior. Porém, se este valor cobrado a maior foi de um servidor, o enfoque da mídia é diametralmente oposto àquele que seria dado se estivéssemos tratando da CPMF, por exemplo.

Mas voltemos ao caso decidido – com muito atraso – pelo STF.

Vamos aos esclarecimentos a fim de evitar expectativas infundadas para alguns e não gerar pânico desnecessário:

  • – Este processo julgado na semana passada chegou ao STF em 2008, ou seja, 10 anos para julgamento;
  • – Esta posição do STF já era majoritária desde 2015, quando o Ministro Gilmar Mendes pediu vista para apreciar a matéria. Naquele momento, já havia maioria de votos e seu voto não alteraria nada. Ou seja, o retardamento do julgamento apenas aumentou a dívida do Governo Federal por conta de maior incidência de juros de mora nos processos já existentes;
  • – O assunto diz respeito apenas aos servidores públicos que ingressaram antes das mudanças constitucionais que acabaram com a integralidade de aposentadoria (em 2003, no Governo Lula) e com a implantação da previdência complementar (em 2013, no Governo Dilma) não tendo nenhum impacto ao INSS, seja passado, presente ou futuro, já que no INSS a forma de incidência dos descontos e a relação disto com o benefício é diferente;
  • – Relativamente aos servidores federais, os descontos a que se refere o julgamento do STF já não existem há mais de 6 anos!

– O único impacto deste julgamento é destrancar as ações já existentes, cabendo ao Governo Federal devolver o que descontou de forma errada. Isto não é prejuízo aos cofres públicos, mas, ao revés, é um direito do contribuinte, neste caso, servidores!

– Ao servidor federal que não entrou em juízo, cabe um alerta: não adianta entrar agora pois já se passaram mais de 5 anos desde a última cobrança.

Logo, é fundamental que os servidores federais procurem se informar junto ao sindicato de sua categoria se este tipo de processo foi movido anteriormente, pois assim poderá ter esperança de receber este tributo de volta.

[1] https://veja.abril.com.br/economia/stf-retira-contribuicao-previdenciaria-do-terco-de-ferias-de-servidores/

[2] https://istoe.com.br/contribuicao-de-servidor-nao-incide-sobre-terco-de-ferias-e-adicionais-diz-stf/