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Efeitos da Lei que altera carreira docente sobre concursos já existentes

Com a entrada em vigor de uma nova lei, surgem inúmeros problemas relacionados com a aplicação do direito no tempo. Aos docentes do ensino federal, estes problemas hipotéticos se tornaram realidade com a edição da Lei 12.772/2012 que, a partir de 1º de março de 2013, reestrutura o Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal. Interessam para este estudo os efeitos desta nova lei sobre os concursos já existentes quando da edição da lei para provimento de cargos docentes nas Instituições Federais de Ensino.

Dentre as alterações trazidas pela L. 12.772 está a forma de ingresso na carreira e o cargo de professor titular.

O ingresso na carreira de magistério superior ocorrerá sempre na classe de professor auxiliar, no primeiro nível, com direito à retribuição por titulação de acordo com a pós-graduação. Há, portanto, uma alteração em relação ao que dispunha a lei antiga, a qual possibilitava o ingresso na carreira na classe de assistente (para os detentores de mestrado) ou adjunto (para os doutores), desde que no primeiro nível.

Com relação ao cargo do professor titular, a lei nova alterou o seu enquadramento no Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Superior. A partir de 1º/3/2013, os cargos de Professor Titular da Carreira de Magistério Superior do PUCRCE passaram a integrar a Classe de Professor Titular. Com a nova lei, a carreira do magistério superior manteve as mesmas classes (auxiliar, assistente, associado, adjunto e titular), porém, dispensando a exigência de concurso para preenchimento da última. Doravante, haverá promoção para a classe de Titular para quem estiver na classe de associado, nível 4.

Ao lado desta carreira em que uma das classes é a de Professor Titular, a lei criou o cargo isolado de professor titular-livre. O cargo de titular-livre e a classe de professor titular coexistem no Plano de Carreiras e Cargos, contudo os acessos são diferentes.

Com esta reestruturação, surgem dúvidas quanto à aplicação do direito no tempo como, por exemplo, a questão relacionada aos efeitos dos concursos públicos iniciados na vigência da antiga lei. Para melhor abordar este tema, tomam-se quatro situações hipotéticas que envolvem a anterior publicação do edital na superveniência da L. 12.772.

Com a superveniência da L. 12.772 após a publicação do edital, quais sãos os efeitos do concurso público e das relações jurídicas daí decorrentes:
1. Concurso cancelado para adequação à nova legislação;
2. Concurso homologado – nomeação e posse a partir de 1º/3/2013;
3. Concurso homologado – nomeação ocorrida antes de 1º/3/2013 – posse a partir de 1º/2013;
4. Concurso homologado para cargo de professor titular – direito à nomeação e à posse no cargo de professor titular-livre.

É importante registrar que o Ministério da Educação editou a Nota Técnica n. 1/13 dispondo que, se o candidato tomar posse a partir de 1º /3/2013, deve ingressar no primeiro nível da Classe de Professor Auxiliar. Vejamos se a mesma encontra amparo jurisprudencial e doutrinário.

De início, o princípio da vinculação ao edital poderia resolver o conflito de leis no tempo na medida em que a lei revogada seria aplicada a todo concurso público iniciado sob sua égide, independentemente da alteração superveniente da legislação. Contudo, a jurisprudência afasta o princípio da vinculação ao edital nesses casos ao argumento de que o edital encontra limites na Constituição e nas leis que lhe são superiores ou supervenientes.

Outro entendimento da jurisprudência é de que o enquadramento inicial do candidato aprovado em concurso público deve observar a lei vigente na data da nomeação, não havendo direito adquirido à nomeação e enquadramento para os cargos e padrões previstos em edital extintos por lei superveniente.

A aceitação da jurisprudência exposta permite responder os dois primeiros questionamentos:

1. Concurso cancelado para adequação à nova legislação: Sequer houve nomeação, não há direito ao enquadramento para os cargos e padrões no edital, edital sem efeitos jurídicos.
2. Concurso homologado, nomeação e posse a partir de 1º de março: aplica-se a L. 12.772/12, não há direito adquirido à nomeação e enquadramento para os cargos e padrões previstos em edital extintos por lei superveniente.

O terceiro questionamento – Efeitos jurídicos do concurso homologado, com nomeação ocorrida antes de 1º de março e posse a partir de 1º de março – é o que mais nos desafia. Apesar de o entendimento jurisprudencial garantir a aplicabilidade de lei vigente à data da nomeação, da leitura do teor das decisões, verifica-se que não há definição ou diferenciação dos efeitos jurídicos da nomeação e da posse. Por serem institutos jurídicos distintos, é preciso ter bem clara a conceituação de cada qual para, a partir daí, definir seus efeitos práticos. Socorremo-nos da doutrina.

Hely Lopes Meirelles, Diógenes Gasparini e Odete Medauar classificam o ato de nomeação como administrativo constitutivo, eis que cria uma nova situação jurídica.

Henry Nézard, Luísa Cristina Pinto e Netto e Esteves de Oliveira compartilham do mesmo entendimento, qual seja, a nomeação, por si só, produz efeitos jurídicos, conferindo ao agente o status legal de funcionário, mesmo sem sua aceitação: por isso, o ato e o efeito existem e são válidos a partir da nomeação.

As conclusões do jurista português Ralph Rodrigues sobre os efeitos jurídicos da nomeação corroboram a ideia acima. Segundo ele, a nomeação é um ato unilateral que confere aos destinatários a qualidade de funcionários e o direito a ocupar um lugar no quadro. O acervo de direitos e obrigações criado pela nomeação fica numa situação de pendência, só produzindo efeitos práticos depois da aceitação dos destinatários. Tal situação de pendência não impede a consolidação, na esfera jurídica dos destinatários, de verdadeiros direitos subjetivos.

Com amparo na doutrina, é possível sustentar que, ao servidor nomeado antes de 1º/3/2013 e empossado após 1º/3/2013, aplica-se a lei vigente à época da nomeação em decorrência de seus próprios efeitos jurídicos. Com a nomeação a administração completa sua atuação, já que a posse e o exercício são etapas que dependem da vontade do cidadão nomeado.

Vejamos o último ponto – a situação dos concursos para professor titular. Há argumentos favoráveis à nomeação e à posse do candidato, desde que preenchidos os requisitos da nova lei, no cargo de professor titular-livre, ainda que o concurso público homologado tenha se destinado ao preenchimento do cargo de professor titular do antigo PUCRCE.

É importante registrar que, para o provimento de ambos os cargos, faz-se necessária a realização de concurso público, em respeito aos princípios da impessoalidade, da eficiência e da isonomia.

Além de não se verificar a existência de diferença substancial entre os requisitos para provimento dos cargos de professor titular do PUCRCE e de professor titular-livre, a L. 12.772/12, no art. 39, já criou 1.200 cargos de Professor Titular-Livre do Magistério Superior.

Desta forma, com a aprovação no concurso público e com o preenchimento de todos requisitos da nova lei, para desempenhar as mesmas funções, é possível sustentar que o candidato seja empossado no cargo de titular-livre, ainda que o concurso público homologado tenha se destinado ao preenchimento do cargo de titular do antigo PUCRCE.